Luz Negra: projeto fomenta combate ao racismo através da fotografia, em Campina Grande
“A luta antirracista é de todos nós”, defende o professor Rostand Melo, coordenador de um projeto da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) que ajuda a levar consciência negra para crianças e adolescentes em Campina Grande, no Agreste da Paraíba. Através da fotografia, o ‘Luz Negra’ tem apresentado aos estudantes da rede municipal de ensino a força da negritude. Neste domingo (20) é comemorado o Dia da Consciência Negra.
O Luz Negra é um projeto de extensão do curso de jornalismo da UEPB idealizado por Rostand com outros professores e estudantes universitários. A iniciativa começou as atividades em 2018, mas a ideia surgiu bem antes, quando o professor atuou na assessoria de imprensa da Secretaria de Educação de Campina Grande.
“Tive contato com alguns projetos desenvolvidos em escolas públicas sobre a valorização da cultura afro-brasileira. Aprendi que existe uma legislação no Brasil que determina a inclusão de temas relacionados às culturas afro-brasileira e indígena no currículo escolar”, explicou.
A partir do conhecimento das leis, o professor, que dá aulas de fotografia no curso de jornalismo, decidiu usar a área como ferramenta pedagógica e levar para escolas da rede municipal de ensino algumas oficinas que propõem diálogo e resultam na prática fotográfica em combate ao racismo e a outras questões sobre o tema.
“Percebemos que a câmera exerce certo fascínio sobre eles. E que era possível aproveitar esse interesse para discutir temas mais sérios, como a questão do bullying e do racismo. Afinal, a fotografia não é apenas técnica, mas também lida com autoestima, principalmente em crianças e adolescentes”, relata o professor.
Ao longo dos anos, o projeto foi caminhando para ser conhecido e se tornar referência na região. As oficinas já foram ministradas em cinco escolas municipais de Campina Grande, presencialmente, e na Escola Cidadã Integral Técnica (ECIT) Plínio Lemos, localizada no município de Puxinanã, Agreste da Paraíba. Atualmente três professores, dos cursos de história e jornalismo, estão envolvidos diretamente na iniciativa.
Em 2020, por conta das restrições impostas pela pandemia da Covid-19, o projeto precisou ser suspenso. Com o retorno das aulas presenciais, em 2022, a iniciativa voltou a funcionar e passou pela Escola Municipal Lafayete Cavalcante, no bairro das Malvinas, na zona oeste de Campina Grande.
Além do combate ao racismo, o Luz Negra também tem levado aos estudantes debates sobre valorização da cultura afro-brasileira, sobre a autoestima negra e sobre a construção da própria identidade. Um trabalho que, para o professor, também se relaciona com o contexto das comunidades em que as próprias crianças e adolescentes que participam do projeto já estão inseridos.
Os estudantes assistidos pela iniciativa usam a fotografia para expressar as próprias emoções e realidades, o que muitas vezes não acontece através de outras ferramentas de expressão, como a voz. Eles discutem questões presentes no dia a dia e formam uma rede de apoio segura para dialogar sobre temas delicados.
“A gente está falando de crianças e adolescentes que estão naquela idade de construção da própria identidade, de começar a compreender qual lugar que ocupa no mundo e o projeto, ao lidar com questões como a representatividade, com a apresentação do trabalho de fotógrafos negros que discutem temáticas relacionadas muito próximo da realidade deles, estimula uma identidade positiva sobre a negritude no Brasil”, diz.
Combate ao racismo como papel social
A celebração do 20 de novembro vai além da lei que instituiu a data como um marco protocolar e de reparação histórica da consciência negra. É primordial que haja a construção de uma educação antirracista permanente e que a pauta das relações étnico-raciais estejam cotidianamente em discussão.
Em 2003, foi instituída a lei n° 10.639/03, que torna obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira em todas as escolas, públicas e privadas, do país, numa perspectiva de ensinar para as crianças e adolescentes a cronologia desses povos e sua importância na construção da identidade do país.
Mas combater o racismo ou suas práticas similares vai além da instituição de disciplinas afins no componente curricular dos estudantes. É dever da escola combater o racismo e outras violências presentes em nossa cultura e que reverberam no espaço escolar, uma vez que o ambiente escolar é constituído pelas mesmas pessoas e valores que circulam fora dele.
O Luz Negra atua nas escolas com o papel de reforçar a importância do combate ao racismo e traz, também, em seus debates a existência de outras vertentes sociais que culminam na prática do racismo e que precisam ser identificadas, combatidas e punidas, como é o caso do bullying.
“Promover um tipo de conscientização, primeiro, que faça a gente perceber o quanto o racismo está presente na sociedade como ele precisa ser combatido, e nos casos em que ele ainda continua ocorrendo, da gente saber que existem ferramentas legais de combate, de punição ao racismo. No caso da sala de aula, a gente vincula essa discussão com a questão do bullying, que é uma coisa que a gente percebeu no projeto é que um dos espaços onde o racismo se reproduz entre crianças e adolescentes é a partir do contexto do bullying”, explica Rostand.
Além da obrigatoriedade da lei, a escola também tem consigo uma forte contribuição como agente social para o desenvolvimento intelectual das crianças e adolescentes, o que torna necessária a difusão do conhecimento sobre suas origens, identidades e culturas, e que sejam inteiramente respeitadas e encontrem valorização na escola.
Promover uma educação antirracista significa, também, oferecer condições e oportunidades para que crianças e adolescentes possam refletir sobre seu lugar na sociedade e para que entrem em conflito com o racismo enraizado em todas as vertentes sociais. De acordo com Rostand, o projeto Luz Negra assume a responsabilidade do que deveria estar presente na pauta de cada cidadão, que é discutir e debater formas de combater o racismo em todas as esferas sociais com ferramentas acessíveis e pedagógicas, como, no caso do projeto, a fotografia.
“É uma responsabilidade que todos nós devemos assumir, não só a universidade, não só a escola, mas toda comunidade, toda sociedade de modo geral e outros espaços de discussão social devemos nos unir e pautar esse tema”, finaliza o professor.
Fonte: g1 pb