FORTALEZA, CE (FOLHAPRESS) — “Quando uma mulher consegue realizar o seu sonho e ser protagonista de algo, vai abrindo portas para outras mulheres.” A afirmação é de Geovana Sousa, 21, estudante de física do Ceará, que detectou 46 novos asteroides durante projeto da Nasa, a agência espacial norte-americana.

“Quando uma abre portas, a próxima terá mais facilidade para entrar, porque uma inspira a outra. É importante ter mulheres fazendo ciência. Se eu sou inspiração ou se outra mulher serve como inspiração, a gente vai além”, diz Sousa.

Ela é aluna do primeiro período do curso de física do IFCE (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará). A descoberta ocorreu em novembro durante projeto Caça Asteroides da Nasa, desenvolvido de forma online e que tem parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações.

Até conseguir detectar o primeiro asteroide, levou um tempo. Sem experiência, começou a observar outras cientistas cidadãs fazendo detecção.

Ela só se inscreveu no programa depois de ver a iniciativa de outra brasileira, mais nova que ela.

“Vi Nicolinha fazendo e isso foi me influenciando. E pensei: ‘gente, eu não sei, mas vou aprender’. Foi na marra mesmo, porque eu precisava aprender de qualquer forma”, lembra.

Ela se refere à alagoana Nicole Oliveira Semião, 8, que identificou 23 novos asteroides após ingressar, em 2020, no mesmo programa de que Geovana participa. Caso a Nasa confirme os achados de Nicole, ela pode ser tornar uma das caçadoras de novos corpos celestes mais jovens do mundo.

Para as detecções, o programa disponibiliza um banco de imagens para cada cientista cidadão. Após a indicação de descoberta, os asteroides passam por uma análise, que pode levar até oito anos, de astrônomos profissionais.

Sendo validada, o autor pode nomear os asteroides encontrados. Geovana, por exemplo, pretende colocar os nomes dos familiares, além de algo que remeta à preservação da Amazônia.

“Vou colocar o nome do meu pai, da minha mãe e de algumas pessoas que conheço. Quero, também, colocar algo que conscientize as pessoas em relação à importância da Amazônia, porque sou brasileira e, além de tudo, amazonense”, explica.

Geovana é manauara, filha de um mototaxista com uma secretária. Quando criança queria ser princesa, mas depois veio na adolescência a paixão pela astronomia. Após a conclusão do ensino médio em uma escola pública de Manaus, foi cursar ciências contábeis, no intuito de arrecadar dinheiro para sair da cidade e tentar concretizar o sonho de ser astronauta.

“Eu não tinha dinheiro para mudar de cidade. Fora isso, eu tinha medo de encarar meus sonhos. Medo de encarar meus próprios desejos”, diz. Em 2020, após passar no Sisu, mudou-se sozinha para o município cearense de Tianguá, a 387 km de Fortaleza.

Durante a pandemia, Geovana realiza trabalho voluntário de divulgação de ciência para crianças, adolescentes e adultos de unidades de acolhimento.

“A gente conta histórias, fala de ciência. É quase um trabalho de alfabetização. Por que estudar tanto, se não repasso o que sei para as outras pessoas? O saber só serve quando o outro também tem acesso ao conhecimento”, declara

Desde que começou a graduação, a estudante trabalha pela criação de um clube de astronomia para alunos de escolas públicas e privadas da região, para que possam se interessar por disciplinas de exatas e conquistar medalhas em olimpíadas de educação.

Atualmente, a jovem cientista sobrevive com os R$ 400 recebidos do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).

É comum, conta, o pagamento atrasar. “Não é um mês ou dois que o pagamento atrasa. Temos tanta gente boa fazendo ciência por aqui. Mesmo assim, a gente não é valorizado, com a ciência sofrendo cortes e mais cortes no orçamento.”

Diante das dificuldades locais, Geovana pretende fazer mestrado no exterior após o término da graduação. “O Brasil está perdendo mentes brilhantes, porque não investe em educação. Eu sonho grande. Eu quero ser funcionária da Nasa, quero ganhar o Nobel. Aqui não terei essa oportunidade, infelizmente.”

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